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POR UMA MILITÂNCIA LGBT SOCIALISTA

[POR UMA MILITÂNCIA LGBT SOCIALISTA]

POR UMA MILITÂNCIA LGBT SOCIALISTA: CONTRIBUIÇÃO AO VI CONGRESSO DO PSOL

A conjuntura política anda bastante turbulenta no mundo inteiro, inclusive no Brasil. Dilma Roussef (PT) e o seu slogan “Coração Valente”, após eleita, buscou articular a aprovação de medidas que pudessem jogar nas costas da classe trabalhadora a conta da crise gerada na lógica desse sistema desregulamentado. Diante da crise internacional e do estelionato eleitoral cometido por Dilma, seu governo perdeu apoio popular e criou as condições para que os setores mais duros da burguesia pudessem articular um golpe.

A articulação do golpe que terminaria por acelerar e intensificar o ajuste fiscal e as contra-reformas iniciadas no governo petista, fez com que o PSOL se posicionasse coerentemente em defesa da democracia, contra o golpe e as medidas de austeridade. O golpe levou o que há de mais conservador e atrasado para a presidência do país, mas não podemos deixar de lembrar que, durante os governos petistas, a negligência com as pautas da militância LGBT foram evidentes, especialmente com o veto ao kit anti-homofobia e a justificativa de que o governo não poderia fazer “propaganda de opção sexual.

Mesmo diante da negligência, parte significativa da militância LGBT posicionou-se firmemente contra o golpe que estava nos planos de Eduardo Cunha e que contava com o apoio dos setores mais duros da burguesia e de todos tradicionais inimigos da população LGBT brasileira. Entendíamos que o que estava em jogo era a defesa da democracia, a correlação de forças da classe trabalhadora brasileira. O processo de impeachment foi um palanque para discursos de ódio contra a militância LGBT, a classe trabalhadora e todas as populações historicamente marginalizadas. Era nítido que o golpe intensificaria uma agenda de precarização da classe trabalhadora brasileira e isso atingiria de forma ainda mais violenta a população LGBT. 

LGBT NO MUNDO DO TRABALHO: A SUPEREXPLORAÇÃO DA POPULAÇÃO LGBT

A transfobia e todo o preconceito ligado à sexualidade e identidade de gênero seguem estruturando o bom funcionamento do capitalismo. Obviamente, o capitalismo tem suas contradições e só serviremos para esse sistema se estivermos consumindo, trabalhando ou encarceradas (os). Portanto, é comum ver marcas que usam trabalho análogo à escravidão fazendo “propaganda pró-LGBT”.

Há um lugar reservado no mundo do trabalho para a população LGBT, em especial para as pessoas trans e travestis. A subalternização das dissidências de sexualidade e gênero tem suas funções para a superexploração, o que não impede que pautas relacionadas aos direitos da população LGBT sejam incorporadas e defendidas por partidos e organizações políticas que buscam manter a ordem capitalista. O que devemos perceber é que não há capitalismo livre de opressão e que a verdadeira superação das normas de sexualidade e gênero nunca será totalmente concretizada dentro deste sistema, pois a lesbofobia, por exemplo, é útil para a manutenção da economia de mercado.

Para nós, LGBTs socialistas, a luta não pode se resumir a uma inserção da população LGBT no consumo. A nossa questão não é pura e somente igualar os direitos da classe trabalhadora. Por exemplo: para uma LGBT socialista, a reforma da previdência fortemente apoiada pelas organizações Globo também é pauta nossa e não é menos importante do que o casamento civil igualitário. É uma questão de classe e não abriremos mão disso e nem secundarizaremos essa discussão, pois o recorte classista tem centralidade máxima em qualquer debate que façamos.

A TÁTICA LGBT NA LUTA DE CLASSES: QUEM SÃO NOSSOS INIMIGOS?                     

Quando vivências subjetivas tornam-se inquestionáveis, temos um problema. A questão não é e nunca foi levar em conta as “vivências”, mas usar essa subjetividade como uma verdade sacrossanta que precisa ser religiosamente acatada. Logo, deixamos a reflexão: se um senhor reacionário que vivenciou a terrível ditadura militar me falar que esta foi ótima, preciso então “respeitar sua vivência”? É certo que as vivências são fatores a serem considerados em qualquer análise, mas considerá-las como verdades puras e inquestionáveis é um erro.

Falar disso é mexer em vespeiro na militância. Há um grupo que decretou: “Não fala da opressão que você não sofre!”. Essa é uma “lógica” perversa para a construção de um projeto popular, porque é individualista e nada tem a ver com a esquerda socialista. Nosso "local de fala" não é o nosso lugar para falar, mas a partir de onde a gente fala.

Para rebater, por exemplo, o discurso homofóbico de gente privilegiada que deseja assegurar seus privilégios, alguns militantes LGBT acabam escolhendo o caminho mais fácil e igualmente despolitizado de atacar o falante no lugar da fala. Depois que nos acostumamos a usar características físicas ou culturais para dizer quem pode falar do que, essa prática foi se generalizando ou propagando, sendo invocada até contra as falas racionais e empáticas. Isso gerou rachas e até “privatizou” certos assuntos para determinadas pessoas, por influência de ideias neoliberais dentro de espaços que reivindicam o socialismo. Representa a perda do caráter coletivo e classista, tão essencial para construções à esquerda. Parece que certo individualismo liberal toma conta da luta.

É preciso aprofundar a discussão sobre os limites da política de representatividade e equivoco em criar ou reforçar categorias estáveis de opressão, ou então deixaremos a guarda baixa perante acusações de deturpação cabal darepresentação.  Se nós assumimos posições casuísticas, abrimos espaço para contradições concretas, como é o caso de Fernando Holiday, jovem negro, gay e conservador.

Criar categorias estáveis de opressão que detém a "verdade", apresentando vivências “inquestionáveis” e “capazes” de produzir as mesmas sínteses, e deturpando o conceito de "local de fala" para privatizar a fala e decidir quem pode falar sobre o quê, abre espaço para que “teorias” transfóbicas e fascistas tentem se apropriar inclusive das discussões feministas. É preciso alertar que devemos combater posições transfóbicas mesmo quando elas nascem de um suposto “feminismo” nada inclusivo.

LGBT E A CONSCIÊNCIA DE CLASSE: ARTICULAR A NOSSA CLASSE COMO PRINCIPAL ALIADA

É preciso entender os processos de ampliação do poder popular e as limitações da classe, ajudando a superá-las. Não precisamos de falas destrutivas, que surgem a partir de um discurso autoritário, banhado em uma interpretação equivocada, tentando substituir o argumento lógico por um ataque puro ao falante. O conceito de desconstrução do argelino Derrida fala exatamente sobre como produzir deslocamentos sem partir de uma fixidez de mim e do outro.

Se não há uma preocupação em entender e ajudar a superar as limitações e preconceito imposto estruturalmente a classe trabalhadora, então não há compromisso com a construção de um partido de massas. Tal melindre pequeno-burguês é contraproducente e acaba engessando de avançarmos na consciência de classe.

Precisamos construir uma militância LGBT anti-capitalista e com uma tática clara para tornar a classe trabalhadora a nossa principal aliada na luta contra a LGBTfobia, que não se curve às idéias liberais e entenda a diferença entre instituições que elaboram o discurso contra dissidentes de sexualidade/gênero e trabalhadoras (es) que são meros reprodutores desse discurso. Não podemos cair no erro de fortalecer uma militância LGBT neoliberal, incapaz de se posicionar contra o imperialismo estadunidense e em defesa do povo palestino, incapaz de defender a revolução bolivariana e os desafios da classe trabalhadora venezuelana, colocando em risco a correlação de forças da classe trabalhadora na América Latina ao tempo que se mostra simpática ao Estado de Israel. A luta pelos direitos LGBT só será plenamente vitoriosa quando se tornar uma luta de todos e todas as oprimidas contra a opressão capitalista. Por isso devemos ser radicais nos propósitos e amplos no método.

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